Com mais tempo em casa durante a quarentena, tráfego na internet aumentou, bem como o número de reclamações — Foto: Claudio Schwarz/Unsplash
* * * Extraído do Portal G1 * * *
Especialistas
afirmam que rede é sólida, mas problemas podem ser encontrados para acessar
alguns serviços que estão com alta demanda ou para realizar tarefas do trabalho
em casa.
Por
Thiago Lavado, G1
O uso da internet no Brasil cresceu durante a quarentena: o aumento foi
entre 40% e 50%, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel), e a alta foi ainda maior para servidores internacionais.
Mas com o aumento do consumo também houve aumento de reclamações. As
instabilidades aumentaram e a própria Anatel registrou um número maior de
reclamações de usuários a partir da segunda quinzena de março — quando o
isolamento passou a ser a regra para muita gente. Alta semelhante foi sentida
no portal ReclameAqui, que agrega queixas de usuários na internet.
Em março, a Anatel registrou 67 mil reclamações relativas a banda larga,
com concentração a partir da segunda quinzena. Em abril, o volume passou de 74
mil e em maio o número foi semelhante, com mais de 73 mil queixas. No ano passado,
houve 50 mil reclamações em março, 48 mil em abril e 47 mil em maio.
O site ReclameAqui, que agrega queixas dos usuários, também viu o número
de publicações contendo o termo “internet” crescer: de 12 mil em março para
mais de 14 mil em abril.
Velocidade
de download caiu, e usuários sentiram
Dados do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC) mostram a
influência da pandemia de coronavírus na qualidade da internet no Brasil. Após
o primeiro caso da doença, em março, o Brasil registrou velocidade de download
abaixo da média e o tempo de resposta ficou acima da média — o que significa
que as solicitações aos servidores ficaram mais demoradas.
A situação tem se normalizado, segundo as medições do NIC, mas foi
sentida pelos usuários.
A advogada Clara Coutinho, por exemplo, teve que renovar a conexão de
seu apartamento em São Paulo durante a quarentena.
Precisando trabalhar de casa, o sinal não era bom no quarto que
transformou em escritório. “Eu passava a maior parte do meu tempo fora de casa.
Quando usava a internet aqui era para coisas simples ou streaming na própria
sala”, afirma.
Por causa disso, investiu: contratou um pacote com velocidade maior e
instalou uma rede de distribuição WiFi, para melhorar a qualidade da recepção
no novo escritório. “Com milhares de reuniões de vídeo com clientes, e sempre
minha internet caindo ou cortando, resolvi aumentar a velocidade”.
Durante a pandemia, quarto virou escritório e precisou de adaptação, com um novo ponto de WiFi e pacote com maior velocidade. — Foto: Clara Coutinho
A rede toda pode parar de funcionar?
Especialistas dizem que não existe
risco de colapso da rede no país e que a estrutura é sólida, e a própria Anatel
firmou uma parceria com as operadoras e prestadoras de serviço para manter a
conectividade durante a pandemia.
“As grandes prestadoras de telecomunicações providenciaram expansões de capacidade
em suas redes para absorver a alta de demanda de tráfego. Os pequenos
provedores e suas associações se empenharam em otimizar suas redes para esta
situação”, disse a Anatel em nota.
Mas as mudanças causadas pelo isolamento — mais gente
trabalhando em casa e maior uso da internet durante o tempo livre —
mudaram o padrão de consumo no Brasil e, também, como muitos usuários percebem
o acesso à rede.
"Houve uma migração abrupta do tráfego de dados dos escritórios
para as casas das pessoas, o que pode ter provocado problemas pontuais, mas sem
causar instabilidade às redes, que continuam operando normalmente",
afirmou em nota o Sinditelebrasil, que representa as operadoras de telefonia e
provedores de internet no país.
Para especialistas ouvidos pelo G1, podem existir
vários culpados pelas reclamações dos usuários:
·
Rede com pouca
banda ou equipamentos ruins;
·
Serviços com
aumento da demanda e muitas pessoas utilizando;
·
Diferença de
expectativa sobre a capacidade da rede doméstica com aumento do uso.
Serviço às
vezes não é ideal
Dados da última pesquisa TIC Domicílios, que afere como e
quantos brasileiros estão conectados à internet, mostraram mais uma queda no
uso de computadores domésticos: 42% dos usuários usaram um computador como meio
de acesso em 2019, uma queda ante o ano anterior. Em comparação, 99% dos
usuários se conectaram pelo celular.
De acordo com Milton Kaoru Kashiwakura, Diretor de Projetos Especiais e
de Desenvolvimento no NIC, o percentual de casas com desktop é baixo e as
pessoas, na maioria dos casos, passaram os últimos anos acessando a internet
nas residências apenas com celular. Agora, com a necessidade de novas
atividades por causa da pandemia, o impacto de redes domésticas menos potentes
pode estar sendo sentido.
“Algumas empresas estão deslocando equipamento das empresas para as
residências. Para quem estava acostumado a usar apenas dispositivo móvel e
agora está com notebook em casa, está enfrentando uma dificuldade maior”,
explica.
A situação piora em bairros afastados e nas regiões do Brasil mais
distantes dos grandes centros. Nesses lugares, há menor oferta de planos, menor
concorrência entre provedores e às vezes faltam conexões mais parrudas, como
por fibra ótica, o que pode explicar velocidades mais baixas e conexões mais
instáveis.
“Não há
justificativa para a falta de banda quando a última milha está bem resolvida.
Nos grandes centros isso tá bem resolvido, existe competição. Se não atender
bem, o usuário migra de provedor. Mas em grande parte do brasil só tem um
provedor e o usuário fica sem opção”, explica Kashiwakura.
Sites podem
ter sobrecarga
Os serviços on-line, sites e aplicativos, estão hospedados em algum
servidor, que recebe as demandas de acesso dos usuários da internet. Quando um
serviço recebe mais demanda do que tem capacidade de suportar, isso se traduz
em problemas da conexão, como redução de qualidade no caso de vídeos e áudios,
ou mesmo na queda do serviço. Alguns cyber-ataques até utilizam essa lógica
para derrubar sites, por exemplo.
Foi justamente para evitar sobrecargas que os principais provedores de
conteúdo do país, ainda no final de março, reduziram a qualidade do streaming
de vídeo, para evitar sobrecarga nos serviços — já que o
número de pessoas consumindo ao mesmo tempo aumentou.
“Alguns serviços
que estão planejados para ter uma certa capacidade de processamento
computacional podem ficar sobrecarregados”, explica Luiz Fernando Bittencourt,
professor do Instituto de Computação da Unicamp e membro do IEEE, instituto que
promove o avanço tecnológico.
Segundo ele, essa redução feita pelas empresas que fornecem conteúdo em
vídeo aconteceu porque houve um dimensionamento para atender à demanda.
“Evita que a capacidade do servidor seja sobrecarregada por muitos
usuários ao mesmo tempo”, disse Bittencourt.
Depois desse redimensionamento, o relatório do NIC apontou para taxas de
download e de tempo de resposta mais próximas do que é medido normalmente pelo
núcleo. A própria Anatel citou o caso como medida necessária para manter a
qualidade da internet.
"Serviços e plataformas online, antes explorados com menor
frequência, ganharam popularidade e força e, por consequência, tiveram que se
adaptar e ampliar a sua infraestrutura para atender à demanda", disse o
Sinditelebrasil.
A rede de
casa não é a rede do trabalho
A contratação de serviço de internet não é necessariamente a mesma em
casas e empresas.
Em grandes companhias, é comum a existência de uma rede interna e a
contratação de um serviço dedicado, que deve manter velocidade constante e um
padrão no fornecimento do serviço.
Já dentro de casa existem taxas mínimas de consumo, estabelecidas pela
Anatel. As operadoras devem fornecer pelo menos 40% da velocidade. No mês, a
média de velocidade não pode ser menor do que 80% do valor contratado.
Contratação do serviço residencial difere do que é feito em grandes empresas, e isso pode ser sentido pelo usuário — Foto: Mike Gieson/Freeimages.com
Para o designer Hugo Vinícius, que passou a ter problemas durante conferências e reuniões em vídeo, esse foi um dos fatores que desmotivou a contratação de um pacote melhor de internet.
Por causa da pandemia, ele foi para o interior de São Paulo e
pensou em aumentar a velocidade da conexão, mas abandonou a ideia.
"Desisti simplesmente porque tenho certeza que isso vai me gerar algum
problema no futuro, com cobrança indevida ou taxas abusivas".
Além da diferença no tipo de serviço contratado, redes
corporativas internas permitem o compartilhamento de conteúdo sem necessidade
de trafegar pela internet. Em casa, essa prerrogativa não existe: todos os
dados passam pela rede pública e competem com outros usuários da residência ou
do mesmo prédio, que também podem estar trabalhando ou estudando naquele
momento.
“Tem uma sensação de aumento de tráfego pelo trabalho em casa.
Diversos serviços que eram presenciais, passaram a ser remotos” afirma José
Eduardo de Freitas, diretor de conectividade, mídia e IP na CenturyLink,
empresa especializada tecnologia de telecomunicações.
De acordo com ele, a empresa viu o tráfego crescer mais de 60% nas
primeiras semanas de home office e muitas empresas começaram a contratar mais
banda e aprimorar suas estruturas de rede, para suportar o aumento no número de
conexões remotas.
“Algumas
empresas não tinham o conceito de home office e tiveram que criar uma estrutura
para isso”, afirma. “Esse prazo de adaptação afeta a percepção do usuário
[sobre a internet]”.
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